SIMPÍCIO DIAS DA SILVA, O TODO-PODEROSO SENHOR DA PARNAÍBA .

Mosaico de textos escritos por Reginaldo Miranda, Josias Clarence Carneiro da Silva, F. A. Pereira da Costa, Cláudio Bastos, Luís Câmara Cascudo, Valdemir Miranda de Castro, Abdias Neves e Ailton Vasconcelos Ponte.

“Nasceu Simplício Dias da Silva, em 2 de março de 1773, na vila de São João da Parnaíba, hoje cidade de Parnaíba, no litoral do Piauí, filho do rico empresário português ali radicado, Domingos Dias da Silva e da mestiça Claudina Josefa, sendo, porém, reconhecido pelo pai e legitimado por provisão real.

Menino rico, foi criado na abastança, embora seu pai nunca tenha regularizado o relacionamento com a companheira. E com pouco menos de 21 anos de idade perdeu o genitor, herdando, assim, um avultado patrimônio que foi dividido entre ele e um meio-irmão mais moço, havido de seu pai com outra mestiça, Maria Dias, o alferes Raimundo Dias da Silva. No entanto, houve denúncia de que ele e o tutor do menor, Manuel Antônio da Silva Henriques, sobrinho e testamenteiro do falecido, lançavam mão da herança em prejuízo do menor”. (1)

“Domingos Dias da Silva procurou dar aos filhos Simplício e Raimundo uma educação de pessoas de alta linhagem e não tergiversou em contratar um perceptor e três brilhantes educadores para os meninos. Um professor de línguas, um mestre de música e dança e um erudito com amplos conhecimentos gerais. O preceptor era incumbido de ensinar aos garotos boas maneiras, equitação e nado. As segundas, quartas e sextas-feiras, pela manhã, o horário era reservado para o nado e equitação; à tarde, música e dança. Aos 12 anos de idade, Simplício Dias já aprendera a dançar e a tocar, razoavelmente, o cravo, a flauta e o violino. Terças, quintas e sábados, pela manhã, ministravam-se-lhes, aulas de línguas cultas: o francês, o inglês e o alemão; o espanhol, o pai fizera questão de ensinar-lhes pessoalmente, pois na infância e adolescência Domingos Dias da Silva por numerosas vezes atravessara a serra do Larouco e estivera em território espanhol, da Galiza. Ás tardes, iniciação à matemática, à física, à astronomia, à geografia e à história etc” (2)

“Adolescentes, os rapazolas foram encaminhados para São Luís do Maranhão, a fim de que complementassem a educação. O futuro coronel Simplício Dias, bastante cedo, demonstrara natural inclinação para a carreira das armas e desusado interesse pelas artes e a vida em sociedade. Suas ambições literárias e políticas só posteriormente se manifestaram, quando em sua primeira estada na Europa. Dominando o francês, o inglês, o alemão e o espanhol, tocando flauta, cravo e violino, delicado de maneiras, dançando bem, expressando-se melhor, fez sucesso rápido nos círculos aristocráticos de São Luís e de Alcântara. A sua diminuta estatura era fartamente compensada pelos dotes do espírito, pelo charme e pelo dinheiro. Tornou-se um líder. Nas ruas estreitas e tortuosas da capital maranhense, promovia serestas, cantava modinhas. Andava sempre cercado de um crescido grupo de admiradores” (3)

Segundo Josias Clarence, Simplício Dias, desleixou-se dos estudos, tornara-se num playboy galanteador, e como tal, envolvera-se em vários romances pitorescos, incluindo um caso de adultério, que causou um grande escândalo e quase lhe custo a vida.

Ao tomar conhecimento desse episódio “O capitão Domingos Dias da Silva, de Parnaíba, ordenou, furioso, o regresso imediato do filho, procurando evitar maior desgraça. Uma semana depois, em obediência à irrevogável e severa decisão do paterna, viajou para Coimbra o irrequieto Simplício Dias da Silva, a bordo da São Domingos”. (4)

“Com Simplício Dias da Silva, o capítulo da Universidade de Coimbra, que deveria ser um instante de superioridade espiritual vivido pelos grandes brasileiros que por lá estiveram, jamais deveria ser escrito, pois constituiu sobre o aspecto ético e cultural um desvario, uma loucura que até hoje ninguém soube ao certo explicar. Chega a ser humilhante, condenável e sem-razão a permanência do piauiense em terras coimbrãs. (5)

“Marginalizado dos estudos, sem se esforçar em adquirir o espírito universitário disciplinado e correto, organizava ele, sob sua chefia, o bando de vadios conhecidos pelo nome de simplicianos. Um grupo heterogêneo e famigerado de rapazes muitos dos quais ex-alunos da universidade, e na maioria colonos portugueses de além-mar. Esses baderneiros motivaram uma série de graves aborrecimentos ao deficiente sistema de policiamento da célebre cidade.” (6)

“Depois dessas degradações, desses vexames e tragédias, a fim de evitar um inquérito que redundaria na expulsão de Simplicio Dias da universidade, comunicou-se aos protetores do arrojado rebelde a conveniência de retirá-lo da cidade de Coimbra e não apenas daquele areópago, onde pontificavam as mais brilhantes inteligências da nação.” (7)

“Ainda muito moço esse rico mancebo iniciou carreira das armas, assumindo o posto de alferes de cavalaria da ordenança de São João da Parnaíba, em 7 de março de 1793. Em 27 de maio do mesmo ano, foi promovido a capitão de cavalaria sendo depois confirmado por ato régio de 14 de junho de 1796, para servir no regimento de auxiliares da guarnição do Maranhão”. (8)

 “Tomou ele parte da tristemente célebre expedição de Axuí, no Maranhão, como ajudante-de-campo do comandante-chefe, expedição essa que tanto desabona os créditos do general dom Fernando Antônio de Noronha, governador daquele Estado, que a empreendeu”. (9)

“Mais tarde, por provisão do governador de 22 de janeiro de 1806, Simplício Dias da Silva foi nomeado comandante militar da vila de São João da Parnaíba, em cujo exercício permaneceu por largos anos.

Nesse ínterim visitou demoradamente diversos países da Europa, frequentando salões refinados e travando contato com as ideias liberais então em voga. Amante das belas-artes, mantinha “banda de música composta por seus escravos, alguns dos quais educados em Lisboa e Rio de Janeiro”… (10)

“Prosseguindo na carreira militar, em 7 de fevereiro de 1809, Simplício Dias da Silva foi promovido ao posto de coronel-comandante do regimento de cavalaria miliciana da vila de São João da Parnaíba, em cujo posto foi reformado por decreto de 28 de julho de 1821, depois de relevantes serviços prestados. Em face dessa patente militar, com a morte do coronel Luís Carlos Pereira de Abreu Bacelar, em 31 de agosto de 1811, foi convocado para integrar em seu lugar a junta trina que então governava o Piauí, recusando sob o pretexto de doença.

Porém, no ano seguinte, rompendo a Guerra da Independência, volveu ao serviço ativo e comandou o regimento de cavalaria n.º 2 da mesma vila, promovendo os feitos mais gloriosos de sua carreira militar na consolidação de nossa independência política, assim, inscrevendo seu nome nos anais da pátria.

Tomou parte ativa no movimento da Independência, liderando-o na Parnaíba, juntamente com o juiz de fora, João Cândido de Deus e Silva, capitão Domingos Dias da Silva Henriques, José Ferreira Meireles, Ângelo da Costa Rosal, Bernardo de Freitas Caldas e tenente Joaquim Timóteo de Brito. Sob a liderança desses próceres do movimento emancipacionista, em 19 de outubro de 1822, ainda sem conhecimento exato do 7 de setembro no Ipiranga, o Senado da Câmara Municipal de Parnaíba, proclamou oficialmente a Independência do Brasil, e sua espontânea união com Portugal”… ”.(11)

“Nomeado presidente da província por C. I. de 25-11-1823, declinou da indicação. Recebeu da rainha dona Maria I, em 05-8-1795, carta de brasão e armas, teve o hábito da Ordem de Cristo, em que professou, o foro de fidalgo cavaleiro da Casa Imperial e foi dignatário da Imperial Ordem do Cruzeiro.

Após a morte do pai, em 1793, passou a dirigir com o irmão Raimundo Dias da Silva, colossal fortuna representada por indústria de charque com 6 grandes estabelecimentos e estaleiros. Em seu solar da Parnaíba mantinha uma banda de música composta de escravos, na maior parte educados em Lisboa e no Rio de Janeiro. Esteve na França e Inglaterra. Lotou pela criação da alfândega de Parnaíba”.  (12)

Simplício, deixando o irmão administrando, viajou para a Europa, como rapaz rico, percorrendo vários países demoradamente. Quando regressou, faleceu Raimundo, e Simplício, dono de uma fortuna vultosa, com mais de 1.800 escravos, instalou-se com o fausto de um príncipe, edificou solar confortável, reformando a Matriz de Parnaíba e ligando-a por uma galeria à sua residência”. (13)

“Simplício Dias da Silva. Coronel de Cavalaria de Milicias. Casou-se a 01/05/1796, na cidade de São Luís do Maranhão, Freguesia de Nossa Senhora da Vitória, no orago privado das terras de dona Ana Maria de Assunção Vieira, viúva do capitão José Vieira da Silva, com Maria Isabel Tomázia de Seixas (14), natural da cidade de Lisboa, prima e dama de companhia da rainha dona Maria I, filha do capitão Antônio José de Seixas e de Maria do Carmo Josefa  de Seixas, por procuração dele, ao capitão José Joaquim da Silva Rosa, e dela, ao seu pai o Capitão Antônio José de Seixas. Foram testemunhas: o governador capitão-general daquele Estado, dom Fernando Antônio de Noronha, e o coronel do Regimento de Infantaria Regular da Guarnição daquela Praça, Anacleto Henriques Franco” (15)

“Era ele admirador extremado do imperador D. Pedro I, a quem mandava presentes valiosíssimos. Dizem que certa vez presenteou-lhe com um cacho de banana, em tamanho natural, todo de ouro e com pedras preciosas no bico das frutas”. (16)

“De todos esses dados se vê, portanto, que não se trata de um homem vulgar, que, se teve defeitos, teve porém virtudes, merecimento cívico e outros predicados que muito honram a sua memória” (17)

O coronel Simplício Dias da Silva faleceu em sua residência, na cidade de Parnaíba, em 17 de setembro de 1829, e foi sepultado na igreja matriz, capela do S.S. Sacramento, ao lado do pai e do irmão prematuramente falecido. E sobre a campa da sepultura se vê, em relevo, na parte superior, o escudo de suas armas, partido em pala, sobressaindo os Dias e os Silva, sucedido do seguinte epitáfio: “Aqui jaz um dos benfeitores desta igreja e donatário desta capela Simplício Dias da Silva, cavaleiro fidalgo professo na ordem de cristo, dignatário da Imperial Ordem do Cruzeiro e coronel de cavalaria de milícias. Foi presidente desta província do Piauí e natural desta vila de São João da Parnaíba, onde nasceu a 2 de março de 1773 e morreu a 17 de setembro de 1829, com 56 anos, 6 meses e 15 dias de idade. Era filho do capitão Domingos Dias da Silva”. (18)

 

“Em 1884, de passagem na cidade de Parnaíba visitamos a casa solarenga de Simplício Dias da Silva, um vasto prédio de sobrado, situado na rua grande, com comunicação interna para a igreja matriz; e de envolta com a mais humilhante pobreza dos seus netos, encontramos ainda veementes vestígios da riqueza e opulência daquela casa”. (19)

 

“O coche (a carruagem dourada) de Simplício Dias, depois que a família empobreceu, era usada como carro funerário, alugavam para as pessoas transportar os defuntos Depois foi vendida para um colecionador do Rio de Janeiro. O negócio foi fechado por uma parente dele que morava em São Luís do Maranhão”. (20)

…………………….

Bibliografia:

 

CASTRO, Valdemir Miranda de – Enlaces de Família – Uma Genealogia em Construção, Edição do Autor/EDUFPI, Teresina, Pi, 2014

//////COSTA, F. A. Pereira da. Cronologia Histórica do Estado do Piauí. Vol. 1. 3.ª Ed.. Coleção Centenário 17. Teresina: APL, 2015.

///////COSTA, F. A. Pereira da. Cronologia Histórica do Estado Maranhão, 3ª edição, Coleção Grandes Textos 9, Teresina: APL/FUNDAC, 2010.

12 – BASTO, Cláudio. Dicionário Histórico e Geográfico do Estado do Piauí, Fundação Cultural Monsenhor Chaves, Teresina, PI, 1994

SILVA, Josias Clarence Carneiro da. Simplício, Simplição da Parnaíba (Lenda do Piauí),  Editora Correio de Timon Ltda, 1978, p. 28.

MIRANDA, Reginaldo – Piauienses Notáveis, coleção centenário 137, Academia Piauiense de Letras, Teresina, PI, 2019 ………….

MIRANDA, Reginaldo – Piauienses Notáveis,  Tomo 2, Academia Piauiense de Letras, Teresina, PI, 2023.

 

Notas:

 

1 – MIRANDA, Reginaldo – Piauienses Notáveis, coleção centenário 137, Academia Piauiense de Letras, Teresina, PI, 2019, p. 361.

2 – SILVA, Josias Clarence Carneiro da. Simplício, Simplição da Parnaíba (Lenda do Piauí),  Editora Correio de Timon Ltda, 1978, p. 28 e 29.

3 – SILVA, op. cit., p. 29.

4 – SILVA, op. cit., p. 53.

5 – SILVA, op. cit., p. 61.

6 – SILVA, op. cit., p. 62.

7 – SILVA, op. cit., p. 65 e 66.

8 – 10 – MIRANDA, op. cit., p, 361.

9 –  COSTA, F. A. Pereira da. Cronologia Histórica do Estado Maranhão, 3ª edição, Coleção Grandes Textos 9, Teresina: APL/FUNDAC, 2010. Texto transcrito por MIRANDA, op. cit., p. 361 e 362.

10 – MIRANDA, op. cit., p, 362.

11 – MIRANDA, op. cit., p, 363,

12 – BASTO, Cláudio. Dicionário Histórico e Geográfico do Estado do Piauí, Fundação Cultural Monsenhor Chaves, 1994, p. 542.

13 – CASCUDO, Luís da Câmara, em nota impressa no livro “Viagens ao Nordeste do Brasil”, do viajante inglês Henry Koster, Fortaleza, ABC, 2003). Texto transcrito por MIRANDA, op. cit., p. 362.

14 – Desse enlace, conforme informações colhidas no site Familysearch, ele teve pelo menos 5 filhos e 3 filhas: Noberto Dias da Silva(1797), Carolina Dias de Seixas e Silva (1801), Helena Amália de Seixas e Silva (1802), Simplício Dias de Seixas e Silva (1805), Domingos Dias da Silva, Lourdes Dias da Silva, Ricardo Dias da Silva e ainda, Antônio Raimundo Dias de Seixas e Silva.

15 –  Arquivo da Sé, São Luís, Maranhão – Livro de casamentos de 1790 a 1798, p.158 e 158v, citado no livro: “Enlaces de Família – uma grande genealogia em construção”, de Valdemir Miranda de Castro, Edição do autor/Edufpi, Teresina, PI, 2014, p. 396.

16 – Texto de Abdias Neves transcrito por MIRANDA, op. cit., p. 365.

17 – COSTA, F. A. Pereira da. Cronologia Histórica do Estado do Piauí. Vol. 1. 3.ª Ed.. Coleção Centenário 17. Teresina: APL, 2015. Texto transcrito por MIRANDA, op. cit., p. 366.

18 – MIRANDA, op. cit., p. 366.

19 –  COSTA, op. cit. Texto transcrito por MIRANDA, op. cit., p. 362 e 363.

20 –  Informação repassada pelo escritor Ailton Vasconcelos Ponte.

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Pádua Marques

Jornalista, cronista, contista, romancista e ecologista.

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