Desde muito pequeno tenho um gosto por tecidos. Desde aquele tempo, quando acompanhava meu pai nas compras de todos os meses, era de ficar observando as prateleiras de tecidos coloridos na loja de velho Antonio Tomaz da Costa ali na rua Almirante Gervásio Sampaio, e outras lojas menores e que agora não lembro nome, naqueles tempos idos da Parnaíba na segunda metade do século XX.
Eu acho que Parnaíba tem no seu velho centro comercial as lojas que vendem os melhores tecidos, os mais bonitos pelo menos, desses tecidos que feitos vestidos dão elegância a uma mulher.
Já adulto adquiri um hábito, o de dar presentes em tecidos. Sim, gosto de dar presentes de tecidos, porque deixo para a presenteada a liberdade de fazer um vestido, uma calça comprida, um macacão, seja lá o que for. E geralmente a escolha na estampa dos tecidos fica naqueles tons mais alegres, floridos, pois a vida precisa de alegria. Pois bem, este costume do gosto por tecidos me traz uma lembrança de minha mãe.
Minha mãe sempre gostava de roupas com estampas alegres, floridas, mas nada de exageros, mas também faziam parte de seu guarda-roupa, aquelas estampas discretas, reservadas, típicas para suas obrigações na igreja da São Sebastião, onde era membro da Ordem Terceira Franciscana e zeladora do Sagrado Coração de Jesus, desde mocinha.
Nos festejos de São Francisco, entre setembro e outubro, se vestia de marrom, o mês inteiro. Em maio, mês de Maria, era de branco.
Mamãe era muito zelosa com suas coisas. Quando ia à igreja levava numa bolsa escura e pequena, o terço, uma cartilha de orações, um véu, que depois perdeu o uso, E eu ficava a observar ela indo pra igreja rezar por todos nós, pedir a bênção de Deus por todos os seus filhos, seus irmãos espalhados pelo mundo, pela saúde de todos em casa, seus vizinhos. E minha mãe ia naquele passo conhecido, pequeno, seguro. E ia elegantemente vestida, sem exageros de pintura com sua roupa de domingo. Mamãe ia para casa de Deus. Portanto ia trajada com discrição.
E aquele seu vestido a mim chamava a atenção. Não havia mulher mais linda no mundo do que minha mãe indo rezar. Sua roupa de sair de casa estava sempre pronta, passada, guardada naquela mala de madeira pesada e onde também eram guardadas as roupas dos filhos menores, e todos as roupas acabavam ficando com aquele cheiro da rua roupa porque estavam juntas a de nossa mãe.
Eu sempre vou recordar minha mãe dessa forma, humilde, mais na hora de sair de casa, saia com elegância, pisando firme, discretamente perfumada, os lábios passados batom e o vestido de sair que até hoje lembro a estampa. Daí meu gasto de dar presentes de tecidos.
Até hoje quando vou ao centro costumo ir ver nas poucas lojas de tecidos do centro velho de Parnaíba, aquelas que inda vendem tecidos. Uns desse lado mais cheios de brilho, desses tecidos que são próprios para casamentos, bailes de formatura, enfim solenidades, lá do outro lado os mais discretos, que lembram senhoras já mais idosas, noutro canto os próprios para chambres, essas peças de dormir. E mais perdidos no centro, da loja, as peças de chitas, tão comuns para vestir as mulheres pobres do interior e que nos tempos de São João, em junho, vão enfeitar os terreiros. E em todos aqueles tecidos têm um pedaço de minha mãe!
*Pádua Marques é contista, romancista e cronista, membro da Academia Parnaibana de Letras e do Instituto Histórico, Geográfico e Genealógico de Parnaíba, jornalista profissional.