*Eric Vinicius, escreve sobre O Tempo e o Vento.
Um pouco depois da euforia causada pela vitória de Ainda Estou Aqui (2024) na categoria de melhor filme internacional, termino as duas primeiras partes de O Tempo e o Vento — O Continente I e II —, de Érico Veríssimo, que, por toda a sua construção, já está no meu panteão de obras favoritas. Segundo o próprio Veríssimo, seu objetivo era escrever uma história do seu estado que fosse apaixonante, já que “os livros escolares não faziam ninguém amar a história do Rio Grande do Sul e de sua gente. Eram, em geral, versões decoradas cujo estilo lembrava um ‘relatório municipal’”. E ele consegue isso com grande maestria. Seus homens, suas mulheres, suas cidades, misturados com as lendas que unem personagens reais e fictícios, através de sua humanidade, constroem toda uma identidade — talvez a que falte ao Brasil.
Seria esse o nosso grande épico ou apenas o do Rio Grande do Sul? Por enquanto, estou convencido de que, no quesito literatura brasileira, ainda falta um romance como esse para muitos momentos importantes da nossa história. Onde está um bom e consagrado romance sobre a construção de Brasília? Sobre a Batalha do Jenipapo? Sobre o heroico trabalho dos nossos abolicionistas? Sobre a Guerra do Paraguai, a Batalha de Cerro Corá e Chico Diabo? Sobre a FEB, os pracinhas?
Quem souber, por favor, me apresente, pois eu mesmo desconheço. Normalmente, para haver um senso de nacionalidade, é preciso existir união, construída numa espécie de comunidade imaginada, como bem escreveu Benedict Anderson, que também se forma através da língua e dos livros. Uma das armas mais poderosas da literatura é criar uma narrativa em torno de si, transformando fatos em lendas e consolidando símbolos, visto que toda e qualquer narrativa histórica começa, antes, como uma narrativa ficcional — Roma com Rômulo e Remo, a Grécia com seus mitos e deuses, a Inglaterra com o Rei Arthur, Portugal com Os Lusíadas — e, junto dessas, talvez, parte da obra de Alencar.
Em um dia em que a conquista de um Oscar une um país inteiro, vale a pena refletir sobre isso, sobretudo quando se trata de um filme que aborda de forma crua um período da nossa história que muitos tentam amenizar ou apagar. Desde 1889, não fazemos nada, sem primeiro antes ouvir e cheirar nosso generais.
Ao olhar para o lado, ainda me deparo com uma pilha de livros que, talvez, ainda me debruce sobre este ano, começando com A Ilíada e passando por A Odisseia. E, como se não bastasse tudo isso, olho novamente o calendário e lembro que também é aniversário de 72 anos do nosso Galinho. Grande dia!
Ps: Em breve também estarei lendo a continuação: O Retrato I e II.
Eric Vinícius é professor da rede privada de Parnaíba, profundo conhecedor da literatura brasileira, meu amigo e um dos mais respeitados intelectuais da nova geração do Piauí.