No sábado dia 13 data que está inscrita na Bandeira do Piauí. Mais especificamente, a data no ano de 1823: o dia em que ocorreu a Batalha do Jenipapo, que foi considerada uma das mais relevantes dentro do processo da independência do Brasil. No entanto, assim como o reconhecimento da importância da batalha não é o mesmo ao longo do tempo, há apenas 19 anos a data estampa a bandeira piauiense.
Foi em maio de 2005 que a Assembleia Legislativa do Piauí aprovou o projeto, de autoria do então deputado estadual Homero Castelo Branco. Até então, a bandeira do Piauí era composta pelas 13 faixas verdes e amarelas, como ainda permanece, e pelo retângulo azul com a estrela Antares ao meio. A alteração consistiu na inclusão da data. No entanto, não foi algo isento de discussões e disputas. Um abaixo assinado com mais de 10 mil pessoas contra a mudança na bandeira chegou à Assembleia.
Para entender como a data chegou ao símbolo piauiense, o Cidadeverde.com conversou com o historiador Fonseca Neto, que foi um dos articuladores deste processo, que tinha o intuito de dar visibilidade à Batalha do Jenipapo.
“Disputa de datas”
O historiador pontua que as discussões sobre as “datas” relativas à independência do Piauí têm discussões há muito tempo. Ele lembra que, desde a época do império, o dia 24 de janeiro de 1823, data que marca a adesão de Oeiras, era celebrado como o que símbolo principal da independência, mas que tinham debates entre os intelectuais e historiadores sobre o dia 19 de outubro de 1822, quando houve em Parnaíba o primeiro gesto de adesão do Piauí à independência do Brasil, e sobre 13 de março de 1823, data da Batalha do Jenipapo, em Campo Maior.
“Durante mais de 100 anos celebrou-se o dia 24 de janeiro. Foi uma data celebrada durante todo o tempo do Império e durante os 36 primeiros anos do período Republicano. Mas essa data, ao longo do tempo, escritores, pesquisadores e políticos reivindicaram, propuseram que podia mudar, poderia ser Parnaíba. Alguns achavam que o aconteceu em Parnaíba foi mais importante, o 19 de outubro, já outros achavam, até que se falava, no [Batalha do] Jenipapo, data esquecida, que teve o derramamento de sangue, e etc., E que Oeiras foi, e tem esse significado, de fato histórico, a adesão, participação oficial do Piauí dizendo sim ao processo de separação de Portugal”, citou o pesquisador.
Na década de 30, Alepi muda o ‘Dia do Piauí’
Segundo o pesquisador, em 1936, a Assembleia Legislativa tinha maioria de deputados da região Norte do Piauí, o que possibilitou, diante dos contextos políticos da época, a transferência da data em que era celebrado o Dia do Piauí para 19 de outubro, em alusão à declaração de adesão da independência por separatistas liderados por Simplício Dias da Silva em Parnaíba.
“Em 1936, na década de 30, há quase 90 anos, a Assembleia tinha maioria expressiva de deputados da região norte do Piauí, e tinha havido a chamada Revolução de 30, um movimento bastante expressivo de mudar a história do Brasil, alguns acharam e propuseram à Assembleia que a data devia ser mudada para 19 de outubro pelo caráter de ser a primeira manifestação, mais contundente, também oficial, para esse debate. E como tinha maioria política, mudaram a data. Evidentemente que a mudança da data não muda a história, mas muda o foco, a discussão”, lembrou.
O reconhecimento à Batalha do Jenipapo
Tanto os movimentos em Oeiras como em Parnaíba são caracterizados pelo protagonismo das pessoas da elite das duas cidades, enquanto a Batalha do Jenipapo representa um protagonismo das pessoas comuns. Segundo o professor Fonseca, essa percepção foi aumentando as discussões para o reconhecimento ao embate em território campomaiorense.
“Lá pelos anos 90, e chegando já a primeira década do século XXI, esse movimento foi levantado por intelectuais, como o Monsenhor Chaves, que é de Campo Maior, escreveu textos. Desde os 150 anos da Independência do Brasil se falava isso, mas veio se transformar numa proposta mais concreta depois”, explicou.
De acordo com o professor Fonseca, a ideia inicial era que a Batalha do Jenipapo tivesse alguma representação em um símbolo oficial. A data de 24 de Janeira, em alusão a Oeiras, já consta no Brasão Oficial do Estado. E o 11 de outubro, da declaração em Parnaíba, é o feriado do Dia do Piauí. Restava uma homenagem ao 13 de março.
“Tivemos a ideia de uma maneira de significar e dar uma igualdade de significados e reverência para o 13 de março. Não seria fazendo um novo feriado ou trocando de feriado, mas que os símbolos estaduais: o hino, o brasão e a bandeira, faziam referência aos Bandeirantes, o próprio dia do Piauí já era uma homenagem a Parnaíba, o 24 de janeiro está no brasão do Estado, aí que veio a ideia de se inscrever na bandeira o Piauí a expressão 13 de março. Acho que foi uma maneira de lembrar e dar uma ressonância simbólica muito maior ao acontecimento de Parnaíba”, lembrou.
Abaixo-assinado contra o 13 de março na bandeira
A tentativa de homenagear a batalha em Campo Maior, no entanto, causou revolta em alguns intelectuais e pensadores de Parnaíba, conforme cita o professor Fonseca. Segundo ele, a insatisfação surgiu por conta de uma interpretação de que estaria sendo diminuída a relevância do 19 de outubro como marco da adesão do Piauí à independência do Brasil. Ele disse que a Assembleia chegou a receber um abaixo assinado com mais de 10 mil assinaturas contra a homenagem na bandeira.
“Alguns intelectuais de Parnaíba fizeram abaixo assinado com mais de 10 mil assinaturas, faziam acusações a mim e aos apoiadores da proposta, disseram que a gente não sabia história. Fizeram abaixo assinado em colégio, mercado, na Praça da Graça, eu sei que conseguiram muita coisa, não é pouco não”, disse.
Tem espaço para todo mundo
Apesar da mobilização, o projeto foi aprovado em março de 2005 e sancionado em novembro do mesmo ano pelo então governador Wellington Dias. Dessa forma, passou-se a se ter, de fato, cada uma das três datas com uma relevância.
19 de outubro de 1822 – Feriado do Dia do Piauí
24 de janeiro de 1823 – Brasão do Piauí
13 de março de 1823 – Bandeira do Piauí
Para o professor Fonseca, a disputa foi importante para o reconhecimento da Batalha do Jenipapo, que cada vez mais, tem atraído a curiosidade não só dos piauienses, mas de pessoas que gostam de história.
“É uma luta que valeu a pena, na minha opinião. Os historiadores diziam que era uma besteira, e eu dizia que é uma batalha simbólica, ela é séria. No Brasil, já era assim há 20 anos, se decide uma eleição sem pensar, só na manipulação de símbolos, ideológicos, políticos. Se entrega na hora da campanha para discutir ‘besteiras’, mas essas simbologias jogam um papel muito importante na afirmação das identidades nacional, do Piauí, por isso forma a mente das pessoas”, citou.
O professor considera que se deve enaltecer a Batalha do Jenipapo porque foi protagonizada por anônimos, gente comum, em um Brasil que ainda valoriza a história dos “vencedores”. “Era uma história sonegada ao grande conhecimento do público, e ainda é porque é a história dos vencidos. E o que a classe média gosta é da história dos poderosos, biografias, dos vencedores”, finalizou.