Bois de mangas. por Pádua Marques.

No meu tempo de menino, quando havia meninos livres do computador, dos jogos eletrônicos e do celular, a gente brincava com o que tinha por perto. Tanto fazia serem meninos que moravam no interior, na dita roça, ou meninos que moravam em casas onde havia quintais. E tendo quintais, tinham mangueiras. E tendo as mangueiras, davam mangas. E eram mangas boas e que maduras, a gente comendo se lambuzava todo. Coisa de limpar as mãos nas pernas dos calções encardidos.

Mas tinham também as mangas que não vingavam e acabavam caindo por causa do vento ou alguma outra coisa que derrubava. Essas, agora no chão, iriam servir pra comida de algum animal pequeno, roídas por besouros ou viravam brinquedo na imaginação dos meninos. Era correr em redor atrás de gravetos ou ir lá dentro de casa e pegar uns palitos de fósforos queimados, jogados perto do fogão, e com eles colocar pernas nas manguinhas. Estava criado o boi de manga.

E a gente, os meninos do meu tempo, ficava horas e mais horas brincando com aquelas coisinhas, falando sozinhos, inventando conversas com pessoas, se dizendo donos de fazendas e tudo o mais. Se vendia e se comprava. Se colocava no curral e se dava de comer e beber. E depois se levava pro pasto. E a imaginação voando pra cima da cabeça dos meninos de meu tempo era coisa de milhões de minutos.

E se eram outros e mais meninos havia a disputa de quem mais tinha essa fortuna, as corridas, as vaquejadas, os pequenos currais de gravetos, a venda e a troca de bezerros e garrotes. Os meninos de meu tempo exercitavam de forma mais natural isso que os estudiosos hoje chamam de liderança. E os bois de manga iam com o passar das horas e dos dias sendo esquecidos no fundo do quintal e agora murchos acabavam sem importância.

Assim são os políticos de nosso tempo. Juntam as pequenas mangas caídas entre o povo ignorante. Aquelas bem verdinhas e que não vingaram e muito menos chegaram a ficar de vez. Os meninos de meu tempo, que são os homens e os líderes políticos de hoje, aprenderam de forma muito simples, natural a comandar e ter sob suas influências os menos instruídos. Os bois de manga são o povo que se deixa manejar sem reação e sem grito.

Sabem estes líderes que sem educação, sem estímulo ao trabalho e influenciados pela imprensa irresponsável, principalmente a televisão e as hoje redes sociais, essa massa é facilmente manobrada pra dentro de currais de graveto.  Estamos vivendo neste momento uma transição entre os meninos e os homens. Entre as brincadeiras e a realidade. E quando este momento mágico dos meninos, de conversar com manguinhas verdes passar, a crueldade dos dias volta a fazer parte da vida de todos. * Pádua Marques é contista, cronista e romancista, membro da Academia Parnaibana de Letras. 

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Pádua Marques

Jornalista, cronista, contista, romancista e ecologista.

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