Um dia desses, logo após ser comemorado o Dia do Piauí, estava eu assistindo a um documentário feito no norte do Piauí sobre as rendeiras de Ilha Grande. E vendo elas, todas senhoras acima dos setenta anos de idade pra cima, falaram de quem haviam aprendido essa arte tão delicada e que nos dá tanto orgulho, que foram as mães, avós, umas tias velhas e essa iniciação tão penosa se deu geralmente por volta dos sete, oito anos.
Foram depoimentos belíssimos, desses que a gente quando vai ficando velho fica também com vontade de chorar por qualquer coisa, principalmente se essa coisa nos traz uma saudade, por ser a nossa terra, nossa gente, uma história de vida, de aprendizado e de superação. E vendo as pequenas alegrias, da camaradagem daquelas mulheres que falaram sobre o que sabem fazer de melhor, a melhor renda de bilros do Brasil, naquela pequenina terra de Morros da Mariana, no Piauí.
Arte essa que particularmente me deixou preocupado de que um dia, acho que breve, vai desaparecer. As meninas de hoje já não se interessam em aprender com suas mães, madrinhas que sejam, os rudimentos dessa arte das rendeiras de Ilha Grande do Piauí. As meninas agora mostram interesse em serem modelos, algo mais interessante originado pelas redes sociais, e não largam o celular um só minuto, e se se perguntar numa roda de adolescentes sobre o que querem ser, vem na ponta da língua que é digital influencer.
Que se danem as velhas mães, avós e tias, as já caducas senhoras rendeiras de Ilha Grande do Piauí. Renda de bilros não dá projeção social, dinheiro, posses de coisas como uma bela casa no Reis Velloso. Negócio é ser digital influencer, dá status, dinheiro pra comprar roupas de marca, dinheiro para passear no Delta tomando champanhe, por cima da carne seca. Fazer renda de bilros, que fique pra velhas que nunca tiveram dinheiro para comprar uma anágua nova.
E me ocorreu uma ideia, não sei se interessante. A de provocar a tão aguerrida comunidade escolar, professores, diretores, população, desses professores e empreendedores sociais que tem mestrado e doutorado, que colocassem nas grandes de disciplinas das escolas, os rudimentos, usando a experiência quase centenária dessas rendeiras velhas da Ilha Grande do Piauí na sala de aula pra essas meninas e meninos.
Alguém há de dizer que leva tempo, não haverá alunos, não terá interesse de meninos e meninas. Se não se tentar aí que não dará mesmo. Porque é mais fácil juntar trinta, quarenta mocinhas num time de futebol, capoeira, seja lá o que for, do que ensinar a fazer renda de bilros? Porque daqui a muitos anos, quando alguém vir a essa região e se interessar em comprar essa arte tão delicada, vai ouvir e sair entristecido que hoje só se faz renda de bilros na China. *Pádua Marques é jornalista, cronista e contista, membro da Academia Parnaibana de Letras.