Três dias depois do Natal e as ruas dos bairros da cidade, ainda em silêncio, estão mais tristes. Como assim?
As crianças também estão mais tristes. Mas por quê? Não ganharam presentes? O papai Noel não passou?
Quem nunca mais passou, foi o Zezé. Sim, aquele grandão, que passava dizendo: Picolé, menino!
Isso não era a marca do produto que levava no carrinho. Antes de mais nada era uma palavra de ordem, um grito de guerra, insultando aqueles meninos e meninas, de todas as cores, todos os credos, de todas as ruas…
Era realmente um insulto. E lá vinham, eles e elas, correndo, com a moeda na mão, pra comprar a guloseima doce gelada.
E ele ali, sempre feliz, um menino -homem-menino, a tirar brincadeiras, chamando pelo apelido de cada um, contando anedotas, espalhando alegria por todos os cantos das ruas.
Por traz do menino Zezé, havia um homem virtuoso, trabalhador honesto, responsável… Antônio José, filho do seu Ernestino e da dona Nega. Um paizão, um marido apaixonado pela sua amada companheira, um irmão, um amigo brincalhão.
Lado a lado daquele homem, uma legião de mil erês, o menino feliz do bairro de Fátima, que jogava petecas, soltava pipa ao vento de agosto, colecionava passarinhos , castanhas e santinhos de candidatos
Esse era o Zezé, brincalhão!
E a vovó lamentou: por onde andará? Nunca mais ele passou.
Nem vai mais passar!
E assim, silenciosas as ruas não mais ouvirão seu chamado, carregado de sabores, insultando a todos, como se o mundo fosse feito só de gente miúda a escutar o chamado inconfundível: “Picolé, Menino! *Dude Marques, é professora, amiga de Zezé e de sua família.